Uniforme olímpico brasileiro é ecológico demais e não de menos

* Ecio Rodrigues

Triste acompanhar as discussões, que além de inúteis são na maioria baseadas em achismos sobre a ciência da sustentabilidade ecológica, em relação aos uniformes preparados pela empresa Riachuelo para cerimônia de abertura e encerramento das Olímpiadas de Paris.

Deixando de lado ideias esquisitas sobre colonialismo europeu, (por sinal o uniforme dos portugueses são tradicionais e comportados) e outras besteirinhas mais inusitadas sobre divisão política na sociedade brasileira, as críticas em relação ao quesito sustentabilidade ecológica e social beiram ao ridículo.

Três pontos centralizam as críticas sobre um falso apelo ecológico (greenwashing para os que preferem o termo em inglês sem tradução para o nosso português) do uniforme olímpico desenhado pela Riachuelo para o COB.

O primeiro e talvez mais grave, diz respeito ao anúncio, pela Riachuelo, de que 100% do tecido usado na fabricação dos quase 1.000 uniformes dos atletas foram reciclados de aparas ou sobras que saem de sua indústria têxtil em Pernambuco.

A empresa confirma que, de concreto, 23% das fibras são recicladas conforme tecnologia desenvolvida pelo reconhecido Instituto de Pesquisas Tecnológicas, IPT, de São Paulo.

Antes de tudo vale esclarecer que o IPT está de parabéns ao conseguir chegar a 23% de reciclagem das fibras, algo um tanto inédito no mundo. As críticas se resumem então aos alegados 100% da propaganda, um exagero de quem não conhece o ramo da indústria têxtil.

Resumindo, 23% de reciclagem é ecológico bem acima da média mundial.

Já o segundo ponto diz respeito ao uso de água na fabricação. Há certo consenso entre especialistas, inclusive aqueles que atuam na área de conhecimento da ecologia, de que economizar água é diretamente proporcional à sustentabilidade.

Assim, o raciocínio fácil afirma que quanto menos água usada na fabricação mais sustentável do ponto de vista ecológico será o processo industrial. 

Esse consenso sempre incomodou muito, posto que a quantidade de água no planeta é a mesma, não aumenta nem diminui, não muda, e sua disponibilidade para a humanidade depende de fluxo.

Explicando. Um lago com água parada e excesso de nutrientes em decomposição sofrerá eutrofização, um fenômeno que impede a entrada de luz e zera o oxigênio da água impedindo a sobrevivência de peixes e vários outros organismos presentes na ictiofauna.

A eutrofização produz odor de esgoto e impede o uso da água para qualquer finalidade. Somente o fluxo contínuo, favorece a oxigenação.

Por isso e em tese, a maior quantidade de água entrando e saindo pode deixar um sistema produtivo, qualquer sistema seja industrial ou agropecuário, mais sustentável em relação à qualidade da água.

Resumindo, economizar água é sempre positivo do ponto de vista do dispêndio de energia e outras medidas, contudo deve-se ter muito cuidado para ser usada como régua de sustentabilidade ecológica.

Finalmente, o mais incrível no inusitado debate sobre a sustentabilidade social dos uniformes olímpicos da Riachuelo foi questionar que o bordado teria sido confeccionado à mão pelas excelentes artesãs de Timbaúba dos Batistas no Rio Grande do Norte, quando as fotos mostravam o uso de máquina de costura.

Somente pessoas com vida muito urbana para desconhecer que a máquina de costura significa o mesmo que feito à mão.

Deve aquele tipo de gente que acha que a batata frita ecológica consumida no tira-gosto do bar não precisa de trator para ser cultivada.

Podem, talvez, não ser um dos mais bonitos, mas com certeza, o uniforme olímpico brasileiro é, de longe, o mais ecológico.

 

*Engenheiro Florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

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