Bioeconomia florestal na Amazônia não pode esperar por 2030
* Ecio Rodrigues
Nunca é demais repetir a lógica de um raciocínio, em tese,
simples. Vamos lá.
Em 2015 os brasileiros assinaram o Acordo de Paris e se
comprometeram em zerar o desmatamento da Amazônia a partir de 2030.
A pecuária extensiva é a atividade produtiva hegemônica na região,
que ocupa as terras com localização mais nobres, nas margens das rodovias (364,
317, 174, 230, 319...) e dos rios (Purus, Negro, Solimões, Madeira...).
Para criar boi solto no pasto o produtor deve desmatar todos os
anos posto que a viabilidade econômica da pecuária extensiva exige a
incorporação regular de novas terras antes ocupadas por florestas.
Bancos de fomento rural, em especial o Basa, fornecem o dinheiro
por meio do necessário e imprescindível crédito oriundo do Fundo Constitucional
do Norte (FNO) para cobrir os custos do desmatamento e do aumento do plantel de
gado na Amazônia.
Mesmo com intensidade de recursos públicos investidos na
remuneração de fiscais e militares, e na compra e manutenção de veículos, a
fiscalização estatal não conseguiu, desde a década de 1970, um ano sequer em
algum Estado com desmatamento zero, mesmo quando se considera somente o
desmatamento ilegal.
Em contrapartida, atividades produtivas baseadas no manejo da
biodiversidade florestal apresentam produtividade bem superior à criação do boi
solto no pasto, porém nenhum produtor rural na Amazônia abandonará a atrativa
pecuária extensiva sem o apoio expressivo da política pública.
Uma transformação produtiva regional desse tamanho, indo da
pecuária para a exploração técnica da biodiversidade florestal, exige
planejamento de longo prazo, mas que deve ter início hoje.
Afinal, trata-se de uma transformação produtiva que depende de um
pacto federativo entre União, Estados e Municípios viabilizado somente uma vez
na história econômica da Amazônia para o legítimo objetivo de tornar a pecuária
extensiva atividade econômica primordial na região.
Por isso, identificar o momento do planejamento estatal em que
ocorreu a alteração de visão que decretou o fim do extrativismo florestal como
atividade econômica e promoveu a pecuária extensiva à condição de única opção
possível, permitirá compreender o equívoco da justificativa técnica que
sustentou essa alteração.
Para se ter uma ideia, o potencial da biodiversidade – tido como o
maior recurso estratégico da Amazônia - foi considerado à época como um dos
principais empecilhos para o crescimento econômico.
Por sinal, a bioeconomia para Amazônia deveria resgatar o momento
em que os planejadores reduziram as potencialidades econômicas do ecossistema
florestal amazônico à oferta de um produto e única árvore: a borracha da
seringueira.
Contudo, ao ser analisada sob a ótica da teoria das vantagens
comparativas e tendo-se como escopo sua inserção num processo de planejamento,
a biodiversidade florestal deve ser assumida como principal referência de
planejamento.
Nunca é demais repetir que o pujante e acessível ecossistema
florestal e a existência de uma população que tradicionalmente sabe como
manejá-lo são as duas maiores vantagens comparativas da Amazônia.
Finalmente, a análise dessas duas vantagens comparativas levará à
constatação do valor ou à precificação, num processo de planejamento, das
potencialidades da biodiversidade específica de cada local e para o conjunto da
Amazônia.
A bioeconomia poderá, considerando a heterogeneidade das
florestas, estabelecer princípios para criar e manter as vantagens comparativas
da Amazônia.
*Engenheiro
Florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em
Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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