Fim do Florestania no Acre: Com ZEE governabilidade foi capturada pelo agronegócio da pecuária extensiva
* Ecio Rodrigues
Governabilidade
é um dos vértices do Triângulo de Governo teorizado pelo economista chileno
Carlos Matus na década de 1970 para analisar o sucesso de um mandato de
governo.
Somada
ao Projeto de Governo, que define o modelo de desenvolvimento e à Capacidade de
Governo, que define a estrutura institucional e de técnicos disponíveis para
execução do projeto, a Governabilidade fornece o lastro social e estabilidade
para superar a oposição política.
Juntos
e avançando de maneira equilibrada formam os pilares considerados cruciais para
que um governo consiga atender as demandas imediatas da população enquanto
direciona o desenvolvimento para uma agenda alternativa.
Até
seu ocaso em 2018, a hegemonia política que venceu cinco eleições consecutivas
e perdurou por 20 anos, mostrou uma força eleitoral e consequente
Governabilidade sem igual na história política do Acre.
Pode
ser que a forte Governabilidade tenha garantido o retorno eleitoral mesmo
depois do Projeto Florestania perder foco no modelo de desenvolvimento ancorado
na biodiversidade florestal, ou de outra banda, ao favorecer a pecuária
extensiva o Florestania tenha perdido significado mas ganhou apoio popular e
Governabilidade.
Difícil
estabelecer, com precisão, a data em que o Projeto Florestania deixou de
priorizar a biodiversidade florestal visando o resultado eleitoral, contudo, a
aprovação da Lei 1.904 que instituiu o Zoneamento Ecológico-Econômico, ou ZEE,
em julho de 2007 no Acre, representa marco histórico indiscutível.
Ao
destinar porção considerável de terras com logística favorecida pela
localização ao longo das rodovias para a pecuária o ZEE aprovado com amplo
apoio dos políticos, reunidos no que se chamou de Frente Popular do Acre, o
Florestania evidenciou o retrocesso.
Em
síntese, mesmo que em um primeiro momento a Capacidade de Governo para
concretizar o Projeto Florestania deu ênfase na valorização da biodiversidade
florestal como principal ativo econômico acreano, o ZEE concretizou o
contrário.
Aquela
suposta determinação inicial por um desenvolvimento moderno a ser alcançado por
uma economia de baixo carbono e ancorada na biodiversidade florestal, que havia
sido estimulada e impingida pelos contratos de financiamento com a tríade
BNDES, Bird e Bid, terminara a partir do ZEE.
Relembrando,
foi a justificativa do aumento do PIB com desmatamento zero por meio da
conservação da biodiversidade florestal que captou o recurso da tríade (Bird,
BID e BNDES), jamais a criação extensiva de boi.
Com o
ZEE, após sua transformação em legislação, o governo estadual determinou que
tipo de atividade produtiva poderia ser implantada em cada local, ou zona, do
território acreano.
De
pronto o ZEE forneceu legalidade para desmatar uma quantidade considerável de
terras florestais localizadas no que se chamou de Zona I, consideradas
propicias para o agronegócio da criação extensiva de gado e plantio de
cana-de-açúcar.
Assim,
aumentar o desmatamento para criar gado solto no pasto, com o ZEE, passou a ser
justificável do ponto de vista legal e, por óbvio, político.
Porém,
a paulatina debandada dos que defendiam o Projeto Florestania priorizando a
biodiversidade florestal e os mais de 30 anos de estagnação econômica da
pecuária, não tardariam a contaminar a Governabilidade.
O
efeito nefasto da mudança de rumo perpetrada pelo ZEE seria percebido pela
sociedade com a publicação das crescentes taxas anuais de desmatamento pelo
reconhecido Inpe.
Somente
para ilustrar, no ano anterior à perda de Governabilidade e ao consequente
fracasso eleitoral de 2018, estudos demonstravam que metade da área de mata
ciliar do rio Acre, em uma faixa de 100 metros de largura, estava degradada
pela pecuária, comprometendo o equilíbrio hidrológico com risco de ocorrência
de secas e alagações.
Sem
Capacidade de Governo para trazer o Projeto Florestania de volta para a
floresta, a Governabilidade, de olho nas eleições, tentou aliciar os
pecuaristas.
Mas
isso é outro artigo.
*Engenheiro
florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em
Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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