Futuro do Acre em duas eleições decisivas: 1998 e 2018
* Ecio Rodrigues
No Acre as campanhas para
governador costumam ser avaliadas segundo 3 variáveis: quantidade e peso dos partidos
participantes da coligação; apoio da máquina governamental; e, obviamente, a
força demonstrada pelo próprio candidato.
As duas primeiras dizem respeito
à disponibilidade de recursos financeiros e humanos. Por sua vez, a terceira se
refere ao carisma e ao prestígio do candidato, algo que, exceto nos casos de
reeleição, só é possível aferir depois de iniciada a campanha.
Em raras ocasiões o plano de
governo apresentado pelos postulantes é levado em consideração. Não dá para
afirmar de maneira categórica, mas isso provavelmente aconteceu em 1998 e 2018.
Em 1998, um candidato de oposição
cujo carisma já havia sido comprovado nas urnas conseguiu a façanha de formar
uma ampla coligação e vencer as eleições.
Ainda que, mais uma vez, não
existam estudos a respeito, a defesa de uma saída econômica (para o estado) por
meio da exploração sustentável da biodiversidade florestal talvez tenha sido o pulo
do gato, o diferencial que caracterizou o novo num quadro político deveras desgastado,
e que logrou virar o jogo eleitoral.
Claro que em política nada surge
de forma espontânea.
Havia, em âmbito amazônico e internacional,
um meio de cultura – que já vinha sendo gerado desde a criação da primeira
reserva extrativista no Acre, em 1990 – propício ao surgimento de um modelo de
desenvolvimento alternativo àquele baseado no desmatamento para criação
extensiva de boi.
Com a realização da Rio 92 – que
aprovou a Convenção sobre Mudança do Clima e pôs em evidência a Amazônia e os
serviços ambientais prestados pela floresta – esse meio de cultura prosperou, levando
a uma reação da sociedade contra o binômio queimada/desmatamento.
Diante do apoio da população acreana
à proposta que valorizava a vocação florestal do estado, os grupos políticos
tradicionais, que respaldavam o padrão de ocupação produtiva escorado na
substituição da floresta por pasto, sofreram derrota histórica nas urnas, mesmo
contando com estrutura de campanha superior.
Naquele momento, em 1998, os
defensores do boi foram confrontados com dois fatos científicos, vale dizer,
incontestáveis: o baixo retorno trazido pela pecuária, tanto em termos de
geração de empregos quanto de arrecadação de impostos; e o elevado impacto
ambiental dela decorrente.
Na verdade, não é preciso muito esforço
intelectual para concluir que, mesmo para uma sociedade que aceita destruir
suas florestas em nome de um suposto progresso, a pecuária é a alternativa que
apresenta menor retorno social.
Embora assegure ao produtor,
considerado individualmente, a obtenção de lucro no curto prazo, a criação
extensiva de boi soma mais prejuízos do que benefícios para a coletividade.
Mas, transcorridos 20 anos e 4
eleições, tudo seria diferente no Acre.
Em 2018, revestida por nova
moldura e consolidada nas pequenas e médias propriedades (no mesmo padrão
produtivo observado nas grandes), a pecuária voltaria a ser apontada como solução
para destravar uma economia que continuava estagnada.
Denominada genericamente de
agronegócio, a atividade passou a ser sustentada, sem exceção, por todas as forças
políticas locais (inclusive a que despontou em 1998 e que permaneceu no poder
por 20 anos), novamente na condição de caminho para o Acre alcançar o esperado desenvolvimento.
Claro que tudo não passou/passa
de ilusão, afinal todo pesquisador da Embrapa sabe que o estado não dispõe de solos,
relevo, hidrografia – na escala necessária para entrar no competitivo mercado do
agronegócio das commodities agrícolas.
Separado o joio do trigo, com o perdão
do trocadilho, o tal agronegócio apoiado por todos os lados na eleição de 2018 –
e também agora, em 2022 – nada mais é que a velha criação extensiva de boi da
década de 1970, que depende de terras com florestas para sua expansão e que atravancou
o progresso do Acre nos últimos 50 anos.
Não à toa, na campanha em
andamento já começou a antiga cantilena que reivindica a disponibilização de mais
terras para fins de desmatamento, seja reduzindo reservas extrativistas ou a
mata ciliar, seja alterando as regras do Código Florestal.
O futuro do Acre continuará
empatado até que outra eleição, em algum momento, traga algo diferente do boi
solto no pasto.
*Engenheiro
florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em
Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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