Alagação termina no Acre, vamos falar da seca?
* Ecio Rodrigues
Por óbvio, todos que se preocupam com os destinos
do Acre sentiram os impactos de uma alagação que deixou milhares de
desabrigados e causou prejuízos econômicos incalculáveis, mas a pergunta é
incontornável: e agora?
Não é preciso se afastar do Acre para encontrar uma
produção científica robusta sobre os fenômenos das alagações e das secas, em
especial nos rios Purus e Acre.
De Manuel Urbano passando por Sena Madureira até os
oito municípios servidos pela bacia do rio Acre, há informação suficiente para
definição com muita segurança de uma política para aumentar a resiliência dos
rios e a resistência pública.
Sendo assim, quais as razões para os acreanos se
afundarem em um sentimentalismo repetido de forma quase anual em relação às
alagações e, mais recentemente, às secas.
Difícil responder, entretanto, como afirma a
ciência política, a elevação de uma agenda humanitária recorrente em pauta para
política pública costuma exigir bem mais que teorias e base científica.
Tal como aconteceu com as várias soluções que
amenizaram os impactos da seca na caatinga e tiraram o nordeste brasileiro da
ladainha do noticiário anual das tragédias nacionais, o investimento da
política pública acontecerá somente quando a mobilização e compreensão social
sobre a alagação orientar o processo eleitoral.
Explicando melhor.
Esse ano, 2024, haverá eleições para vereador e
prefeito. Sem exceção todos os candidatos, na capital e no interior, que
almejam uma vaga no parlamento ou como gestor da cidade, vão defender a criação
extensiva de gado como atividade econômica primordial para o desenvolvimento do
Acre.
A compreensão social dos acreanos sugere que
investir no agronegócio, que, no caso acreano, se resume quase que
exclusivamente na pecuária extensiva, não consegue fazer uma associação de
causa e efeito bem simples: cada boi sobrevive, em média, de dois hectares de
pasto.
Avançando um pouco mais no raciocínio, não faz a
ligação crucial de que nos dois hectares de pasto usados para criar apenas um
boi havia antes uma floresta tropical com mais de 400 árvores e arbustos que
recebiam o impacto das chuvas antes dos rios.
Finalizando o raciocínio, restaria vincular ainda o
desmatamento para plantar capim com a alagação.
Muitos vão gritar que o desmatamento é um processo
inevitável e natural para a ocupação produtiva do território e a alagação é
causada pelo El Niño ou outro fenômeno climático qualquer, resumindo todo um
leque de distrações na expressão: choveu mais em duas horas que …
Associar desmatamento com alagação e seca é ponto
inicial para ajudar a inserir os transtornos de excesso e falta de água no rio
Acre em um problema que possui solução por meio da política pública na cidade e
no Estado.
Existem soluções e ciência para resolver a tragédia
da alagação com o dinheiro público existente no orçamento estadual e municipal,
sem ter que apelar para a sensibilidade da União. Pode parecer inacreditável,
mas não é!
Finalmente, nunca é demais repetir.
Não foi São Pedro que mandou chuva demais agora ou
mandará de menos quando chegar em julho, o problema tem origem no desmatamento
que faz com que a chuva de São Pedro escorra de uma terra vazia de árvores para
o rio, se transformando em alagação ou seca, respectivamente.
Controlar e encontrar solução para abandonar a
nefasta era da criação de um boi solto em dois hectares de floresta que virou
pasto é a solução.
*Engenheiro
florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em
Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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