Cota de Reserva Ambiental e o valor da floresta na Amazônia
* Ecio Rodrigues
Com a promulgação do Código Florestal de 2012, nada
menos que 58 dispositivos da nova lei foram impugnados perante o STF.
Depois de um julgamento deveras complexo, que compreendeu
a análise de 4 ADIs, em 2018 o Supremo decidiu pela constitucionalidade da
norma como um todo, fornecendo, finalmente, a necessária segurança jurídica aos
investimentos no setor primário do país, sobretudo àqueles relacionados ao
agronegócio.
A decisão do STF, pode-se dizer, pôs um ponto final
às polêmicas que cercaram o debate e a aprovação do Código na Câmara e no
Senado.
Debates que consumiram mais de 5 anos, tempo bem
acima do normal, mesmo para o lento processo legislativo brasileiro. Um número
expressivo de eventos para a discussão do projeto de lei foi organizado pelos
parlamentares, e a realização de audiências públicas, que ocorreram em todas as
capitais e cidades de maior densidade demográfica, teve início ainda em 2010.
Ou seja, a despeito da alegada pouca participação pública
em tais eventos, seria incorreto afirmar, por outro lado, que não houve espaço
para discussão com a sociedade.
Outro ponto que merece destaque nesse processo diz
respeito à diferença de posicionamento político entre a proposta concebida na
Câmara e a que foi aprovada no Senado.
Enquanto a primeira proposta priorizava a manutenção
e ampliação da área destinada ao cultivo de soja, capim e outras espécies do agronegócio,
os senadores, por seu turno, demonstraram maior preocupação com a conservação
das florestas.
Resumindo, o Senado introduziu no Código Florestal importantes
mecanismos destinados a promover a geração de renda por meio da exploração florestal
sustentável.
É o caso do Cadastro Ambiental Rural, do Programa
de Regularização Ambiental e da inovadora Cota de Reserva Ambiental-CRA, título
nominativo representativo de área coberta por vegetação nativa.
O Decreto 9.640/2018, publicado no final do Governo
Temer, regulamentou o procedimento para emissão, registro, transferência,
utilização e cancelamento da CRA, na condição de instrumento financeiro passível
de comercialização, por meio do qual a área florestal excedente à reserva legal
de uma propriedade pode ser negociada.
A reserva legal, como se sabe, corresponde a um
percentual da área total da propriedade que obrigatoriamente deve ser mantido
com cobertura florestal, não podendo ser utilizado por corte raso para fins
agropecuários.
Alguns estabelecimentos rurais, notadamente na
Amazônia, já não cumprem essa imposição, e a CRA representa uma resposta
objetiva ao problema – na medida em que possibilita que a área de floresta que
sobra em uma propriedade compense a ausência de reserva legal em outra.
Isto é, ao adquirir títulos CRA, o produtor pode comprovar
a manutenção da reserva legal e, dessa forma, satisfazer a exigência do Código
florestal, regularizando o seu empreendimento.
De outra banda, a CRA estimulará a valorização da
floresta – tornando mais próximo o dia em que um hectare de floresta na
Amazônia terá mais valor do que um hectare de pasto.
Nesse dia, a meta do desmatamento zero da Amazônia
poderá ser alcançada sem depender da vontade do governo federal.
*Professor Associado da
Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política
Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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