Licenciamento a ‘joia da coroa’
Em seu artigo, o
ambientalista Procópio de Castro comenta sobre o Licenciamento ambiental e
alerta para o fato de que o modelo atual atende não às demandas da sociedade,
mas sim o crescimento da economia.
*Procópio de Castro
Pela qualificação e
quantificação das demandas de uma atividade e/ou empreendimento humano é
possível levantar as consequências, os impactos no ambiente e, assim, estudar
as ações necessárias para minimizar estas alterações no meio. Onde não for
possível a minimização do dano, é preciso prever a reparação do mesmo pela
compensação ambiental. Este é o mundo conceitual que embasa o licenciamento e
está previsto e normatizado nas leis brasileiras dentro das premissas de
comando e controle; comando dado pelas leis cujo controle é viabilizado pel
fiscalização. O modelo legal demanda conhecimentos técnicos apurados e
transdisciplinares nos estudos de viabilidade e impactos dos empreendimentos,
pessoas qualificadas e bem remuneradas nos órgãos licenciadores, um número de
fiscais adequados, assim como infraestrutura para o seu pleno funcionamento.
O licenciamento
ambiental é a ‘ joia da coroa’ da gestão sustentável por proporcionar a
possibilidade do controle e minimização dos impactos das atividades humanas.
Esta sustentabilidade seria alcançada pela realização de estudos prévios de
avaliação dos impactos, de viabilidade adequacional com o local do
empreendimento, de riscos da atividade para o meio ambiente e a sociedade, de
opções tecnológicas menos degradantes, de levantamento de práticas da
minimização destes impactos. Complementando os estudos, condicionantes são
aplicadas para a implantação de um empreendimento, prevê-se monitoramento
continuo e fiscalização em todas as fases e a participação da sociedade para
opinando sobre ao que ela entende ser o melhor. Põe essas e outras ferramentas
previstas no licenciamento, pressupõe-se que as atividades humanas podem ser
efetivadas sem degradar ou pelo menos diminuir a degradação ambiental, usando
hoje os recursos naturais e permitindo o seu uso no futuro pelas novas
gerações.
A realidade não tem
sido favorável à natureza devido à característica do sistema econômico vigente,
no qual o lucro e o desenvolvimento constante demandam cada vez mais dos
recursos naturais e incentiva o consumo desenfreado. Entretanto, esse modelo
atende não às demandas da sociedade e sim ao crescimento da economia. O
licenciamento de joia da coroa passou a ser considerado “impedimento” deste suposto
desenvolvimento no discurso dos empreendedores. Por isso, o sistema e as normas
do licenciamento passam por ataques sistemáticos que buscam a sua facilitação e
agilidade. Assim, a questão dos impactos ambientais são minimizados sob a ótica
do empreendedor e não o da natureza – nem da sociedade.
As taxas de
licenciamento, compensações ambientais, multas por danos e outras ferramentas
para capitalização de recursos deveriam ser a base do capital para a manutenção
da estrutura; para o sistema de gestão ambiental das reparações aos danos.
Infelizmente, elas têm sido desviadas pelo sistema político governante para
outros fins, suas multas isentadas em perdões milionários e um desmonte
sistemático do sistema de licenciamento ocorre a partir de baixos salários,
falta de infraestrutura e falta de pessoal qualificado.
Os estudos de
viabilidade e impactos, como o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), a (AIA)
Avaliação de Impacto Ambiental, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), têm
apresentado baixa qualidade, deixando lacunas que suscitam pedidos de reestudo
que atrasam o processo do licenciamento. Como estes estudos estão sob a
responsabilidade do empreendedor, fica a questão de o porquê dessas lacunas:
são por desconhecimento ou por falta de licitude? As leis cada vez mais
designam aos municípios o licenciamento de mais atividades econômicas, mas
estes, majoritariamente, não têm condição técnicas, legais e estruturais para
executá-las, pela falta de uma Secretaria de Meio Ambiente. A maior parte dos
municípios mal tem uma diretoria de meio ambiente, sem Conselhos de políticas
públicas e fundos instalados, e na ausência de Código Municipal de Meio
Ambiente, os cargos são de indicação política e ocupados por quem não é da
área. Além disso, no município as pressões de grupos econômicos acabam por ser
o maior peso decisório e nem sempre a favor do socioambiental.
As áreas de
fiscalização a as diretorias de meio ambiente sofrem de todo tipo de carência
de infraestrutura para exercer o licenciamento e a fiscalização, ficando
reduzidas à liberação de alvarás de funcionamento. Neste momento vários
movimentos de alteração da legislação estão em andamento nos estados (Ex.: lei
Estadual MG Nº21972 de 21 de janeiro 2016) , do Projeto de Lei 654/15 o Senado,
do Projeto de Lei 3.729/04 na Câmara de Deputados, e a proposta alteração da
alteração da Resolução Conama 01/86 e 237/97, de autoria da Associação
Brasileira de Entidades de Meio Ambiente (ABEMA).
A ABEMA é a associação
dos órgãos licenciadores estaduais. Estas iniciativas estão deixando a
sociedade preocupada pois são propostas que em seu princípio buscam: facilitar
o licenciamento: redução da participação da sociedade; redução da
interferências dos órgãos técnicos como os de defesa patrimônio; Indígenas e
quilombolas; redução de prazos nas análises e dispensas de estudos técnicos
como Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA);
supressão de fases do licenciamento até mesmo para atividades de conhecida
capacidade de degradação ambiental e risco social; centralização as decisões em
órgãos licenciadores e ou comissões de fundo econômico em poder dispensar
etapas do licenciamento de estudos técnicos; redução de parara estudos e
pareceres; desconsideração de efeitos cumulativos de uma atividade numa região
focando no licenciamento pontual desconsiderando a soma dos impactos negativos.
A continuar esta tendência, não teremos nem a joia nem a coroa e a
sustentabilidade mais distante começará a se acostumar com “Marianas”.
*Procópio de Castro – Presidente do Instituto Guaicuy – SOS Rio das Velhas
in EcoDebate,
29/03/2016
"Licenciamento
a ‘joia da coroa’, artigo de Procópio de Castro," in Portal EcoDebate,
ISSN 2446-9394, 29/03/2016,
http://www.ecodebate.com.br/2016/03/29/licenciamento-a-joia-da-coroa-artigo-de-procopio-de-castro/.
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