Amianto foi banido pelo Supremo, quando deveria ser pela sociedade
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Antes de tudo, e
para não deixar dúvida: a
extinção de mercado do amianto no Brasil, ou banimento, como
prefere a imprensa, foi uma das boas notícias para a
sustentabilidade do planeta na despedida de 2017.
Finalmente, depois de muito tempo de indecisão e depois de esgotar-se
a paciência das indústrias, dos trabalhadores e das organizações ambientalistas,
o amianto crisotila foi banido do mercado nacional.
Como o outro
tipo de amianto (anfibólio)
já havia sido suprimido nos anos 1990, significa
dizer que de agora em diante estão proibidas, em
território brasileiro, as atividades de extração,
beneficiamento, transporte e
comercialização desse minério, para qualquer finalidade – inclusive
para a fabricação de telhas e
caixas d’água, os dois principais produtos oriundos do amianto.
É o fim da única
mina de amianto em operação no país, considerada a maior
da América do Sul e pertencente à Eternit. Desde
a década de 1960, essa mina, localizada na cidade de Minaçu,
em Goiás, vinha abastecendo
a demanda nacional e exportando uma quantidade
expressiva dessa perigosa matéria-prima.
Ao julgar uma
ação direta de inconstitucionalidade proposta há mais de 10 anos pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Indústria, o Supremo entendeu que o manuseio e a exposição
ao amianto configuram desrespeito
à Constituição, em especial aos preceitos que estabelecem o direito a um meio
ambiente equilibrado.
O voto do ministro relator,
que foi seguido pela maioria de seus pares, levou em conta a evidência científica
que demonstra a relação de causa e
efeito entre amianto e câncer. Para a Organização Mundial de Saúde, maior
autoridade planetária no assunto, o mineral está
vinculado a uma série de doenças cancerígenas. Trata-se, assim, de um fato
científico sobre o qual não pairam dúvidas.
O Município de Minaçu, que depende da exploração do amianto, irá enfrentar uma
depressão econômica sem precedentes. Ao que parece, a
sensibilidade manifestada pelos ministros do Supremo em relação a matérias ambientais e de saúde pública suplantou a preocupação com a economia e os empregos.
Talvez esteja aí o problema.
Ninguém vota em juízes, e por mais que o ódio aos
políticos seja fomentado a todo instante por uma mídia despreparada, não existe outra via para resolver questões essenciais à sociedade, senão
a política.
Todas as vezes que
o Supremo se arvora no papel de legislador, as
decisões são tomadas sob certo distanciamento da população. Afinal,
diante da constatação de que mais da metade das habitações
possuem amianto em seus telhados e
caixas d’água, a
resposta pela via da política com certeza estabeleceria
prazo para transição – ao invés de optar pelo dramatismo do
banimento imediato.
Enfim, caberia ao
Congresso, ou seja, aos deputados federais
e senadores, na
condição de representantes do povo legitimados em processo eleitoral
transparente e democrático, a função de discutir, negociar e aprovar legislação
ordinária ou, inclusive, emendar a Constituição se fosse o caso, de forma a não haver lacunas no encerramento do assunto.
Por encerrar o assunto, entenda-se uma solução definitiva, capaz de trazer segurança jurídica
e deixar claro aos atores sociais e agentes
econômicos que não há volta. A garantia de que
não haverá retrocesso só é possível no Congresso.
Por outro lado, mais
uma vez se observa a inércia do Parlamento, que deixa a cargo do Judiciário
decisões que remetem à função legislativa – o que só agrava a crise de
legitimidade que o Congresso atravessa.
A despeito dessas
considerações, contudo, é inegável que um passo significativo
foi dado para a consolidação da relação entre economia e
meio ambiente no país. E, desta vez, mediante a imposição de limites ao capital. Coisa rara.
*Ecio Rodrigues
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela
Universidade de Brasília.
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